Não quero trabalhar no inferno!

janeiro 11, 2012

Era mais um daqueles dias que gostaríamos de esquecer.

Logo pela manhã o trânsito já sinalizava que as coisas não caminhariam bem. O carro da frente insistia em perambular pela rua com uma lentidão torturante. Justo naquele dia que ele precisava chegar mais cedo ao escritório para finalizar um relatório que, de tanta pressão que recebeu para entregar, parecia ser a salvação do planeta.

Até mesmo ouvir o noticiário no rádio trouxe uma refinada dose de autopunição. Cada matéria, escolhida pelos jornalistas naquele início de manhã, revelava uma desgraça ou uma injustiça ocorridas recentemente. O cenário fora do carro também não era muito animador. Os ônibus e as lotações passavam abarrotados de pessoas espremidas e sufocadas.

Nenhum sorriso, nenhuma alegria, apenas rostos angustiados e concentrados em seu próprio universo, talvez apenas esperando que aquele dia acabasse logo.

Quando ele chegou ao seu trabalho, descobriu que, durante a madrugada, um problema nos computadores destruíra o relatório que havia preparado durante a semana.

Assim, aquilo que seria uma simples revisão se tornou um castigo imenso, comprometendo as outras atividades do dia, inclusive o almoço de reencontro com um antigo colega de escola.

Voltando para sua casa no fim do dia, sentia uma sensação de déjàvu, pois os carros lentos, os ônibus lotados e os rostos angustiados faziam novamente parte do cenário.

O único pensamento que conseguia formular sobre isso era o de que não havia nada de novo, tudo sempre fora assim.

Ao chegar em casa, depois de estacionar seu carro, encontrou um vizinho simpático que lhe perguntou:

– Como vai, vizinho?

A resposta saiu sem energia e quase automática:

– Vou indo…

O vizinho não quis ampliar a conversa, talvez por receio de se contaminar com a falta de entusiasmo da resposta.

Ao entrar em casa, ele foi recebido por um garoto que não tinha altura suficiente para um cumprimento mais próximo e, sendo seu filho, curvou‑se para dar‑lhe um beijo.

O movimento revelou-se traumático, pois seu corpo sedentário não lhe proporcionava a flexibilidade de outros tempos. O sedentarismo também determinou suas próximas ações, fazendo que o prometido jogo de bola com o filho fosse novamente adiado para outra ocasião.

Digeriu o jantar durante uma nova dose de autopunição, dessa vez proporcionada pelo telejornal. Depois de cochilar no sofá por alguns instantes, entregou seu corpo para a sedutora cama, começando seu sono com imagens e pensamentos das atividades que realizaria no dia seguinte.

Muitos anos se passaram, e essa rotina foi se cristalizando de tal forma que parecia fazer todo sentido. Quando era questionado sobre sua vida, ele sempre respondia:

– Vou indo…

Quando seu filho já tinha altura para cumprimentá‑lo sem que isso representasse um esforço físico, ele foi surpreendido por uma pergunta:

– Pai, sempre vejo você cansado, chateado, esgotado. Você não parece feliz! E para onde está “indo”, quando as pessoas cumprimentam você?

Ele não tinha uma resposta pronta, mas tentou esboçar um argumento que pudesse ser coerente:

– Filho, eu sigo minha vida, vou indo para onde todos nós vamos. Gostaria de ser mais feliz, sim, mas o meu trabalho é um inferno. Quando chego de lá, estou completamente acabado. Desde que assumi a chefia do departamento, não tenho tempo para mais nada. Gasto parte de minhas energias cuidando de garantir o meu emprego, pois minha posição é muito cobiçada por causa dos privilégios que tenho – também, com tantas responsabilidades, alguma coisa eu precisava ter de vantagem. Mas a verdade é que eu não vejo a hora de me aposentar e sair de lá. Aí eu vou ser feliz!

Antes que o filho comentasse, ele perguntou:

– Mas e você, meu filho, o que pensa em fazer da vida?

Pra onde vai?

O jovem respondeu:

– Pai, não sei pra onde vou no futuro, mas uma coisa eu posso lhe garantir, vou pensar muito antes de querer ser chefe. Talvez eu queira ter outro tipo de trabalho, em que possa apenas realizar projetos e não ficar lutando por cargos. Não sei se conseguirei, mas de uma coisa já tenho certeza: não vou mandar meu currículo para sua empresa, pois eu quero ser feliz antes de me aposentar. Não quero trabalhar no inferno!

 

 

 

 

Fonte: trecho do livro “Geração Y – Ser Potencial ou Ser Talento? Faça por merecer” de Sidnei Oliveira – Integrare Editora

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